Um governo que não sabe contar: 9 anos 4 meses 2 dias, ou menos. – Sinan Eden

Há poucas profissões que ainda dão sentido às vidas de quem trabalha e produzem algo útil à sociedade. Digo isto não só como doutorado em matemática, mas também como trabalhador de call centers. Se trabalhares em consultadoria ou num banco, sei que vais entender do que estou a falar. E ainda mais se trabalhares na setor publicitário ou na indústria militar (ou petrolífera, que em última análise é mais ou menos a mesma coisa).

Há professores que trabalharam durante 9 anos, 4 meses e 2 dias mas recebem salários como se tivessem entrado na escola ontem.

O congelamento das carreiras é algo que durante sete anos não consegui compreender. Estudas, entras no trabalho, assinas um contrato com várias condições sobre salários, pensões e a progressão da tua carreira e depois, um dia, o teu patrão anuncia uma nova regra e muda o teu contrato unilateralmente. É uma coisa impossível de imaginar, até na Turquia. (Lá, para se atingir esta situação, ou tem que se chantagear o trabalhador para assinar novo contrato, ou simplesmente que demitir quem não assinar – quem não assina de certeza deve ter alguma ligação terrorista, certo?) Aplicar o roubo dos direitos retroativamente foi tão estranho para mim que, nos primeiros cinco anos, neguei a possibilidade de isto ter acontecido num país europeu. Mesmo falando com amig@s professores, estive a dizer-lhes que isto não podia ser, que provavelmente tinham percebido mal, etc. Uma estupidez minha, um derivado duma estupidez de vários governos.

Enfim, o Ministro da Educação não sabe contar nem contabilizar. Nove anos, quatro meses, dois dias. É para contar e contabilizar, não é para negar ou negociar.

Curioso, como os números e o negacionismo dos números une os vários governos e vários assuntos.

Para evitar um caos climático irreversível, temos que descarbonizar as nossas economias em 20 anos. Para ter zero emissões em 20 anos, os governos têm de agir agora (aliás, anteontem) e começar a reduzir as suas emissões radicalmente. Portugal, por exemplo, tem que cortar emissões nacionais em 60-70% em 15 anos.

E que diz o governo sobre isto? Em primeiro lugar, no seu Roteiro para a Neutralidade Carbónica diz que vai reduzir as emissões em 11-24% em vez de 60-70%. Depois, quer fazer mais furos de petróleo e gás, quer construir um gasoduto de 160 km (Guarda-Bragança), e faz acordos com Trump para comprar gás de fracking aos EUA.

Falamos muito (às vezes demasiado) utilizando números na luta pela justiça climática: Temos que deixar 80% dos combustíveis fósseis no solo. As infraestruturas de combustíveis fósseis já existentes são mais do que suficientes para ultrapassar os 2ºC de aquecimento global; por isso não se pode iniciar nenhuma nova infraestrutura de combustíveis fósseis. Para estar de acordo com estes números, o governo deve criar um Serviço Nacional do Clima e empregar 100 mil trabalhadores para lançar uma transição energética justa e rápida.

Até Guterres disse que faltam dois anos para travarmos a crise climática. O Ministro do Ambiente não sabe fazer contas, a Ministra do Mar não sabe fazer contas, o Primeiro-Ministro não sabe fazer contas. Em solidariedade, o Ministro da Educação também não sabe fazer contas, e não valoriza o trabalho d@s professor@s – se calhar com medo de que estes formem uma nova geração de dirigentes que saiba fazer contas?

Faltam-nos 2 anos para mudar de rumo e construir uma sociedade que consegue contar até 9 anos, 4 meses e 2 dias.

Precisamos urgentemente de nos unirmos para pararmos com esta comédia, antes que ela se torne uma tragédia permanente.

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