Custos associados à adaptação, a prejuízos e danos (que vão para além de danos a infraestrutura e propriedade, mas incluem também danos emocionais, de saúde pública, e de vidas humanas) serão cada vez mais incomportáveis. Quanto mais esperarmos para travar esta crise, cortando emissões, piores serão
A noite de 7 para 8 de Dezembro foi uma noite de caos na zona metropolitana de Lisboa. Chuvas intensas devastaram várias partes da cidade, causando uma morte e danos ainda incalculáveis.
Comerciantes e famílias por toda a cidade fazem contas aos prejuízos. Os danos causados obrigarão a despesas públicas e privadas de valor elevadíssimo. Contudo, como relembrado pelos climatologistas, estes são eventos cuja ocorrência se tornará mais frequente a cada ano, e cuja força e nível de estragos se intensificará.
Carlos Moedas, na manhã de dia 8, relembrou que “estes fenómenos extremos estão a acontecer cada vez mais em Lisboa” e que “é bom não esquecer o que as mudanças climáticas estão a fazer”. De seguida, o presidente da câmara notou a importância dos avanços na implementação tão atrasada do Plano de Drenagem de Lisboa, que começará com a construção do túnel de drenagem MonsantoSanta Apolónia. “A obra estrutural da cidade” que tem início finalmente anunciado para Março. Segundo Carlos Moedas “a partir daí podemos evitar estas cheias”.
Certamente face aos problemas já há muito identificados neste sentido, este plano parece relevante. Contudo este não evitará uma maior frequência e intensidade de eventos climáticos extremos. Este tipo de obras de forma alguma substitui planos reais de mitigação das causas estruturais da crise climática. “Evitar estas cheias”, assim como todo conjunto de outras catástrofes, implica parar de queimar combustíveis fósseis.
Os custos associados à adaptação, a prejuízos e danos (que vão para além de danos a infraestrutura e propriedade, mas incluem também danos emocionais, de saúde pública, e de vidas humanas) serão cada vez mais incomportáveis. Quanto mais esperarmos para travar esta crise, cortando emissões, piores serão. Mas é preciso clareza: planos de adaptação estão condenados a falhar se não houver mitigação.
Só planos de mitigação baseados na ciência climática e dirigidos para a justiça social e democracia energética permitir-nos-ão evitar esses custos. Adicionalmente contribuirão para a criação de serviços públicos acessíveis a todas as pessoas, criação de empregos dignos, redução da pobreza energética e construção de soberania e segurança energética.
Assim, paralelamente ao Plano de Drenagem que anuncia, deve ser implementado um plano real de descarbonização da cidade. Isto passa por um investimento massivo em transportes públicos urbanos movidos a energias renováveis, em mobilidade partilhada e em ciclovias, enquanto se cancela o novo aeroporto e se reduz as atividades do aeroporto da Portela. Ao mesmo tempo, deve haver um investimento público na reabilitação de casas e outros edifícios, em autonomia energética nos edifícios públicos e na descentralização da produção de energia para uma maior resiliência. A Campanha Empregos para o Clima apresenta propostas concretos neste sentido, num plano real sobre como mitigar as alterações climáticas de forma justa em Portugal.
Se Carlos Moedas reconhece a ciência climática e as causas das mudanças climáticas a que se refere, certamente em breve anunciará o restante plano para “evitar estas cheias”, já que não é possível adaptação ao caos climático.
Este artigo foi originalmente publicado em: https://expresso.pt/opiniao/2022-12-08-Evitar-as-cheias-nao-ha-adaptacao-para-o-colapso-climatico-9e89e056