O acordo de Paris ultrapassa as «linhas vermelhas» fixadas pela sociedade civil.
Em momentos difíceis, esperamos de uma conferência internacional que tome decisões corajosas e visionárias. Não foi o caso na COP 21, com um acordo muito abaixo da mudança de rumo exigida. Ao Estado de urgência climático, o acordo de Paris contrapõe uma manta de retalhos constituída pela soma dos egoísmos nacionais, tanto em matéria de financiamentos como em objectivos de redução de emissões. Há que não esquecer o essencial: o acordo de Paris confirma um aquecimento climático superior a 3ºC, sem se dotar de dispositivos para voltar à trajectória de 1,5ºC ou mesmo 2ºC.
O acordo de Paris é ambicioso?
- Aprovando contribuições nacionais que rumam a um aquecimento superior a 3ºC, a COP21 mostra-se incapaz de desactivar a bomba climática.
- O objectivo de 1,5ºC, embora não sendo um objectivo obrigatório, não conseguiu disfarçar a falta de empenho quantitativo na redução de emissões de gases de efeito de estufa para os próximos anos. (art.2)
- Nenhuma data foi mencionada para o pico das emissões, o objectivo a longo prazo, apresentado para 2050, apenas diz respeito à segunda parte do século; a formulação do objectivo a longo prazo abre a porta à utilização massiva de técnicas inapropriadas tais como armazenamento e fixação do carbono, a compensação de emissões de carbono e à geoengenheria.
Sem um documento claramente estabelecido, sem a menção aos pontos de passagem em 2020 e 2050 fixados pelo GIEC (Grupo Intergovernamental de Peritos sobre a Evolução do Clima) para se regressar a uma trajectória inferior a 2ºC, o acordo de Paris põe em perigo o simples direito de viver de numerosas populações por todo o planeta.
Está o acordo de Paris dotado de meios suficientes?
- A ausência de 100 mil milhões como valor mínimo de financiamento, no acordo de Paris, remetido para o texto de decisão do COP 21 e consequentemente sujeito a futuras novas arbitragens, fica sem força vinculativa e sem melhorias em comparação com o de Copenhaga.
- A falta de transparência e previsibilidade de financiamentos para depois de 2020: nenhuma menção a “novos” e “adicionais” termos que evoquem financiamentos futuros, pelo contrário, a Convenção não se refere a mais do que a termos “adequados” e “previsíveis”.
- Ausência de reequilíbrio no lucro à adaptação.
Após 25 anos de negociações, e apesar de nunca terem desbloqueado os financiamentos necessários, os países ricos são historicamente responsáveis pelo aquecimento climático embora tentem sempre desembaraçar-se das suas responsabilidades.
O acordo de Paris é um bom exemplo de “ justiça climática”?
- A eliminação das referências aos direitos humanos e das populações indígenas e à transição incluídas nos artigos do acordo foram remetidas para os preâmbulos;
- Claro enfraquecimento do mecanismo de “Perdas e Danos” visto que tudo o que diga respeito às responsabilidades jurídicas (“obrigações”) foi retirado deste acordo.
O enfraquecimento do mecanismo de perdas e danos soa como uma confissão de culpabilidade dos países responsáveis pela desregulação climática.
O acordo de Paris é universal?
- Os sectores da aviação civil e transporte marítimo que são perto de 10% das emissões mundiais (Alemanha e Coreia do Sul) estão isentos de qualquer meta.
- Numeroses contribuições dos Estados ( INDCs), nomeadamente dos países mais carenciados, dependentes de financiamentos adicionais para levar a cabo a sua transição energética e políticas de adaptação: esses financiamentos não estão lá e não estão garantidos para o futuro.
O acordo de Paris não se dá ao trabalho de ser universal e recusa atacar a máquina de aquecimento do planeta que é constituída pela globalização financeira e económica.
O acordo de Paris é juridicamente vinculativo?
- O acordo de Paris não transforma os INDCs em compromissos vinculativos e os mecanismos de revisão dos compromissos são pouco vinculativos.
- Nenhum mecanismo de sanção é aplicado para punir os Estados que tomem compromissos insuficientes, que não os levem a sério ou que se recusem a rever em alta a sua ambição.
Enquanto que os acordos de liberalização do comércio e do investimento sancionam os países quando estes não respeitam as regras estabelecidas, ainda nada no género existe, em termos de luta, contra as emissões de gases com efeito de estufa.
O acordo de Paris é dinâmico?
- Será impossível adicionar nos anos vindouros tudo o que não está no texto do acordo de Paris ($100 mil milhões como patamar,…).
- Inventários estão previstos (balanços) a cada cinco anos mas a execução das revisões em alta está dependente da interpretação do texto e da boa vontade dos estados.
O acordo de Paris é diferenciado?
- Com a execução dos INDCs, os diferentes Estados aceitaram, em Lima, auto-diferenciar-se em matéria de emissões de GEE: cada país coloca em cima da mesa o que quiser.
- Em matéria de financiamentos, enquanto a Convenção-quadro prevê que os países que são historicamente mais emissores desbloqueiem os financiamentos necessários para os países que precisam para proceder à adaptação e atenuação das emissões, os Estados Unidos e seus aliados tentaram continuar a sua obra de desmantelamento dos princípios da Convenção.
O acordo é equilibrado?
- Nenhum mecanismo claramente definido para facilitar a transferência de tecnologia, nomeadamente para eliminar as barreiras de acesso produzidas pelo direito da propriedade intelectual;
- Foi deixada a possibilidade aos países, nomeadamente aos mais emissores, de utilizar os mecanismos de compensação de carbono para atingir os seus objectivos, em detrimento de uma redução doméstica das emissões.
- Manutenção da referência do “ crescimento económico” (art.10).