Portugal tem Ministro do Ambiente? – João Camargo

[Artigo publicado no site da revista Sábado no dia 1 de setembro de 2016]

Quase um ano após a tomada de posse do actual governo, fica ainda por saber se há ministro do Ambiente. Sabemos, e bem, o importante que foi acabar com a confusão dos super-ministérios de Assunção Cristas e de Moreira da Silva (embora seja estarrecedor continuar a existir um Instituto da Conservação da Natureza e Florestas, que fez acabar com a conservação e transformar o instituto num conselheiro da produção de pasta de papel) e sabemos o importante que foi passar a haver um ministério só do Ambiente. Também não é de desprezar que o actual ministro, João Matos Fernandes, tenha sido escolhido principalmente pela sua competência em transportes e no sector das águas, cuja des-destruição é vital. Mas fica a questão: e quem é que é o ministro do Ambiente? Há?

Da boca de João Matos Fernandes ainda não se ouviu, em público, uma posição, uma declaração acerca das concessões de gás e petróleo, em terra e no mar, com a possibilidade de fractura hidráulica nas duas, com o Deep Offshore (exploração a grande profundidade) em cima da mesa.

Sobre as óbvias consequências ambientais de explorar petróleo e gás no país, seja a destruição de solos e aquíferos em Pombal, na Batalha ou numa zona em desertificação como é o Algarve, seja a certeza da poluição crónica de sondagens e explorações marítimas ao longo do todo o litoral nacional abaixo do Porto, nada.

Sobre o facto de estarem previstas explorações dentro de áreas protegidas como os Parques Naturais das Serras de Aire e Candeeiros, do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina e da Ria Formosa, com impactos directos nas Reservas Naturais das Lagoas de Santo André e Sancha, Berlengas, Paul de Arzil e Sapal de Castro Marim, nas Paisagens Protegidas da Rocha da Pena, da Fonte Benémola e da Serra de Montejunto, mais nada.

Num contexto de alterações climáticas, e estando o ministro seguramente informado dos cenários para Portugal, da necessidade de adaptar o território e mitigar as emissões, não houve uma palavra sobre explorar hidrocarbonetos, directamente responsáveis pelas alterações climáticas.

Pelo contrário, ouvimos o Secretário de Estado da Energia, Jorge Sanches, pôr e dispor deste assunto como se ele fosse estritamente energético. Não é. E embora saibamos dos apetites tardios por óleo sujo de uma economia com todas as condições climáticas e geográficas para ser totalmente renovável, é inaceitável que este assunto possa ser lidado como se fosse uma questão técnica. Não é. A exploração de petróleo e gás em Portugal mudaria o país para pior. Desde logo, ambientalmente. Mesmo se ignorarmos o risco de maré negra (que aumentaria exponencialmente com a entrada em funcionamento de uma indústria petrolífera), a exploração rotineira contaminaria os ecossistemas e colocaria em causa todas as actividades costeiras como a pesca, o surf e o turismo. Tornar-nos-ia um país pária, assinando um Acordo de Paris, que sabemos ser insuficiente para manter o aumento da temperatura abaixo dos 2ºC, para imediatamente o começarmos a violar. Tornaria o país mais pobre, porque já se percebe pela leitura dos contratos que não haveria qualquer impacto no preço dos combustíveis, com 100% do que for descoberto a pertencer às concessionárias. Tornaria o país mais estúpido ainda, porque precisamos abandonar os combustíveis fósseis, quer os que importamos, quer os que eventualmente existam no subsolo. Para resolver esta questão é preciso, além de uma avaliação técnica e jurídica, uma posição política que olhe para o futuro.

Para que isso aconteça não precisamos de um Secretário de Estado da Energia, precisamos de um Ministro do Ambiente.

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