Vira a COP e toca o mesmo – Diogo Silva

25 anos depois da primeira COP (na sigla inglesa de “Conference of Parties” da Convenção Quadro das Nações Unidas para as Alterações Climáticas), o falhanço é claro: as emissões que causam a actual crise climática subiram continuamente. Desde a assinatura do histórico Acordo de Paris, há uns meros 4 anos, já vamos em 4% de aumento global de emissões. Os últimos relatórios do consenso científico da mesma ONU indicam-nos que temos agora 10 anos para as reduzir em 50% e nenhum caminho actual parece levar-nos lá.

A crise climática é o expoente máximo da globalização de um tipo de pensamento ocidental que vai frontalmente contra a sustentabilidade – não do planeta (esse até seria mais sustentável sem humanos), mas sim da vida na terra. A sustentabilidade de uma vida digna para qualquer humano não é possível com uma discriminação sistémica, que se baseia em fatores que ninguém pode controlar: o nível de rendimentos da minha família, a cor da minha pele, o meu local de nascimento, o meu sexo, a minha orientação sexual, ou boa parte das minhas capacidades físicas. Ainda assim, o nosso movimento tem sido apelidado de radical por defender o valor de toda a vida, independentemente de qualquer fator à nascença. Ser realmente radical é achar que podemos sair desta crise com o mesmo tipo de pensamento que nos trouxe até ela.

Numa semana em que Greta Thunberg é eleita pessoa do ano pela revista TIME, em que mais de 500.000 pessoas se manifestaram em Madrid por um caminho diferente, e na qual culminou o maior ano de sempre de mobilização pela justiça climática, a verdadeira COP aconteceu na rua e a COP oficial continua a ser um espaço do pior tipo de diplomacia: de cowboys brancos contra índios de todas as cores, ignorando a vontade da maioria da população gloabl e em particular dos que mais sofrem hoje com esta emergência; enquanto se discutem mudanças cosméticas e se atrasam decisões cruciais. Protestos feitos por delegações de observadores são bloqueados, enquanto delegações inteiras de empresas de combustíveis fósseis continuam dentro das negociações (preservando a sua sobrevivência à custa do ecogenocídio de boa parte do globo). Já vamos em 25 anos de COPs sem resultados práticos.

A esperança está num movimento com força política para fazer a mudança necessária. O mesmo movimento que tornou possível o fecho das centrais de Sines e Pego nesta legislatura (faltam planos para uma transição justa que assegure esses empregos), que fez com que o Ministro do Ambiente agora já diga que o gás na Bajouca e Aljubarrota não faz parte dos planos do Governo (falta cancelar contratos), que tem liderado a contestação ao aeroporto do Montijo e feito parte do travão urgente às dragas em Setúbal e ao Lítio em todo o país.
A esperança está no crescimento deste movimento, porque as decisões fundamentais são tomadas pela sua força política e pela sua vontade.

Caso contrário, a música de fundo continuará: vira a COP… e toca o mesmo.


Artigo publicado originalmente no Expresso a 13.12.2019.

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