Do latim [activus+ismo], o ativismo é uma atitude moral que insiste mais nas necessidades da vida e da acção que nos princípios teóricos.
É costume dizer-se que nasci com a alma desassossegada. Tudo começou quando tinha dez anos. Encetei por uma pesquisa profunda sobre o quotidiano do povo africano, em especial das crianças. Não queria crer que do outro lado do globo havia pessoas a morrer à fome. Dizia querer ser voluntária na UNICEF e partir para África. Durante a minha adolescência, defini-me como feminista e encarei com mais seriedade a exploração do mundo e das pessoas. Aos 18, parti para Lisboa, a 350 km da minha cidade, para seguir um dos meus maiores sonhos – estudar Direito. Entre ruas e ruelas, manifestações e vigílias, debates e conferências, entre pessoas sem casa e pessoas com perspetivas diversas das que tomo, nasceu a empatia. E um sentimento de impotência. Nasceu a atitude que queria ver e ser no mundo: ativa. O ativismo, para muitos um passatempo, é, para mim, um modo de estar na vida. É dar voz àqueles a quem foi silenciada.
“Ultimamente, assiste-se a um comodismo sólido quer no âmbito das relações sociais, quer na vida política e até nos costumes e tradições de cada sociedade.”, dizia Zeca Afonso. Num mundo positivado pelo lucro e pela status quo, em que a falta de empatia é gritante, a capacidade de se colocar no lugar do outro escassa, urge elevar as nossas vozes em uníssono, urge conectarmo-nos com aquilo que realmente importa: o planeta e as pessoas.
O primeiro passo para o desassossego e a evolução é a desalienação da nossa realidade pessoal. Conseguimos reconhecer que a sociedade está doente quando vemos que o solo, a água, o ar e todos os seres vivos estão em constante ameaça? Se o reconhecemos, pois, então, digamos sem medo: “precisamos e queremos mudança”. Se atentarmos nas estatísticas, cerca de 80% da riqueza mundial está nas mãos de menos de 20% da Humanidade. Este desequilíbrio na balança económica marginaliza, exclui e deixa de lado. Este desequilíbrio gera opressão, discriminação, destruição do planeta. Este desequilíbrio mata.
20% da população mundial consome recursos a um ponto tal que os retira às nações mais pobres e às gerações futuras. Estamos a caminhar para o colapso do planeta e das pessoas. O Papa Francisco, sempre certeiro, diz-nos: “devemos dizer “thou shalt not”: a uma economia de exclusão e desigualdades que idoliza o dinheiro. Devemos dizer “thou shalt not” a uma economia que explora infinitamente recursos finitos e que sobrepõe o crescimento económico ad eternum ao bem-estar das pessoas. Para tal, é necessário parar.
Coincidência ou não no último ano, fomos obrigados a parar. As vulnerabilidades do sistema em que vivemos não tardaram a vir ao de cima, com o exemplo do movimento antirracista exponenciado pela morte de George Floyd, nos EUA, e de Bruno Candé, em Portugal. A par de uma crise sanitária, confrontamo-os com uma crise económica, nanceira, ambiental e social. Urge a resposta à questão: “como queremos que seja o mundo depois do vírus covid-19?”.
O que fazer aos vírus silenciados pelas instituições políticas e económicas? O racismo, o machismo, o patriarcado, as alterações climáticas antrópicas, o neocolonialismo, o tráfico sexual, a homo e transfobia, a exploração de trabalhadores e crianças, o terrorismo, a guerra, a ascensão da extrema-direita.
A nossa sociedade está doente. As pessoas e o planeta estão doentes. A cura passa por cuidarmos-nos mutuamente. Passa por valorizamos o que é essencial nas nossas vidas. A cura passa por uma economia que coloque os cuidados pela vida, pelas pessoas e pelo ambiente no centro das decisões políticas.
A minha indignação profunda permitiu-me encontrar a coragem dentro do pânico. Da minha existência fiz um ato de resistência. Resisto para viver e grito por uma sociedade justa e inclusiva para todos.
Nesta Primavera, desafio a todas criarmos a nossa própria História. Sairmos às ruas em ações de desobediência em massa, contra um sistema tóxico que nos vai continuar a queimar se nada fizermos. No dia 19 de Abril, dia de aniversário do Partido Socialista, às 19h00, a Climáximo vai estar no Largo do Rato, à frente da sede do partido, a fim de reivindicar menos aviação e uma transição justa inerente ao aumento da ferrovia. Esta ação irá ter como objetivo a convocação de uma ação de desobediência civil em massa no Aeroporto de Lisboa, dia 22 de maio.
A nossa casa está a arder. Nós somos aquelas de quem estávamos à espera. E tu, vais ficar a ver?
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Artigo originalmente publicado na revista Humaniza-te do Núcleo de Estudos Humanitários a dia 22 de abril.