“Transformative collaboration” – Ivan Barbeira

O título do curso não mente. A minha experiência na Ulex foi de todo transformativa.

Eu tinha grandes expetativas para o curso, mas nenhuma ideia tangível de como seria e, tenho a dizer, que fiquei completamente deslumbrado. Estar no meio das montanhas, numa aldeia praticamente isolado? Ui, eu entrei lá como uma criança maravilhada com tudo e todos! E desde logo que reaprendi algo em mim que tinha esquecido nos últimos tempos. Como o poder da minha energia e a agência da minha presença podem ter e criar nos outros. Esta realização sucedeu-se motivada pelo curso, pelo o espaço e pelas pessoas. Era um meio que permitia que nos abríssemos, que fossemos vulneráveis com completos estranhos, que estavam cá por uma causa em comum, fazer mudança sistémica neste mundo.

Eu despejei medos, inseguranças e desafios que tinha e elas responderam-me ouvindo, ajudando-me a crescer, a ver e a pensar nas minhas falhas, a tentar resolvê-las. Os nossos exercícios assim o motivavam. Eram focados na importância da colaboração, no que é ser um grupo transformativo (como o nosso é), de nos libertarmos do indivíduo atomizado a que esta sociedade nos sujeita e que nos impede de realmente entender
como juntas, em coletivo, podemos criar uma mudança efetiva na nossa comunidade e sociedade.

Mas que desafiante! Tentar chegar a consenso num grupo, ouvir ativamente os outros, falar sobre as expetativas e necessidades, dar e receber feedback, refletir sobre como e quem somos como indivíduos e como participamos em grupo. São tudo desafios que vale a pena meditar algum tempo sobre e que trazem imensos frutos a nível de crescimento pessoal e interpessoal.

Muito disto não era novo. Eu já o tinha sentido, começado a compreender, a sentir na prática nos poucos meses que tive connosco na Climáximo, mas dedicar uma semana inteira a trabalhá-lo, entendê-lo e refletir sobre o assunto elevou por completo esta realidade e quase como que enraizou em mim o porquê de querermos participar colectivamente, de fazer a mudança todas juntas.

Daí ter retornado com um fervor em focar-me nas relações. Pois é um foco em que a Climáximo quer e pode crescer, mas, de facto, nos primeiros tempos em que eu estive no coletivo senti-me bastante sozinho. E eu entendia e justificava-me que tinha de ser eu a ultrapassar esse medo, a fazer a minha voz ser ouvida, a querer ser eu a fazer a mudança, mas podia muito facilmente ter desistido logo no início. E acredito que há tantas outras pessoas que por nós passam e assim o é. Não se sentem capazes de ultrapassar essa barreira. É difícil fazê-lo. E mais, é difícil fazê-lo num coletivo como o nosso em que somos um grupo informal, em que temos todas vidas fora do ativismo, em que nos vemos só duas horas por semana e existimos através de reuniões e uma app. Sei que a motivação inicial de participar nesta luta não é de criar relações fortes, é uma
sensação de missão que nos prende e nos faz querer mover, mas sabemos que parte desta missão é mudar os modos de pensar, os modos de agir e os modos de ser. Se não o sabemos vamos aprendendo com o tempo, quando entendemos que sozinhas não somos suficientes. E se não fosse a Ulex, por muito que eu já tivesse esta compreensão e visão, talvez ainda demoraria algum tempo a compreendê-la de todo. Pois o que a Ulex fez por mim foi desenterrar e materializar todas estas sensações de que sim precisamos de olhar umas pelas outras, de nos fazer crescer juntas, de ativar um compromisso maior do que nós, por uma causa maior do que nós.As pessoas querem ser ouvidas tanto como querem ouvir. Eu abri-me e recebi em troca mentores que queriam que eu crescesse, que me deram forças, mesmo estando elas tão ou mais perdidas pela imensidão da tarefa.

Mas depois claro que penso se haverá espaço e tempo para nos estarmos a debater com isto tudo face à urgência climática, face às adversidades que nos pressionam, mas tem de haver. Tem de haver espaço, tem de haver relações fortes a suportar todo este compromisso, pois este caminho assusta. Se não quem é que me vai levantar nos dias em que me vou abaixo, que sinto apatia, que não quero ver nem mais um pouco de ativismo à frente?

Se, quando nos propuseram a imaginarmos uns anos no futuro, eu imaginei-me como ativista climático não foi pelo que andava ou ia fazendo pelo coletivo, foi pela força que ganhei na comunhão daquela semana. Foi por entender que, por debaixo de todas as nossas posições, interesses, necessidades e dificuldades, existem valores e objetivos em comum que florescem se olharmos umas pelas outras. O ser individual atomizado é algo que ainda me penetra imenso o ser, foi como me desenvolvi nesta sociedade, mas é na colaboração que vejo a luz e aconteceu, especialmente, através da colaboração transformativa que vivi e que espero continuar a viver.


Texto escrito em seguimento do curso Transformative Collaboration no Ulex, em Outubro de 2021.

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