“O governo deve baixar os impostos sobre os combustíveis?” é uma pergunta diferente de “O governo deve baixar o preço dos combustíveis?”, embora haja um esforço para confundi-las. A resposta é também diferente. O governo deve baixar o preço dos combustíveis no curto do prazo e definitivamente não deve baixar os impostos sobre os combustíveis.
Reduzir os impostos sobre os combustíveis não dá qualquer garantia de reduzir os preços dos mesmos. Esta iniciativa só garante que os lucros das empresas de combustíveis (produtores e distribuidores) são menos impactadas. É natureza do cartel do monopólio fossil explorar todas as circunstancias históricas (reais ou provocadas) para expandir lucros, e a situação atual não é excepção. Há uma guerra de contornos inter-imperialistas na qual uma das partes possui petróleo e gás, recursos dos quais a outra parte depende massivamente. No entanto, não existe nenhuma razão material para o aumento dos preços que não seja especulação – a Rússia não cortou um só metro cúbico de gás ou litro de petróleo no abastecimento. Desde a invasão da Russia a 24 de Fevereiro, a União Europeia já terá pago 13 mil milhões de euros à Russia para comprar gás, petróleo e carvão. Portugal já pagou 1657 milhões de euros à Rússia desde esse o dia (maioritariamente petróleo, muito menos em gás).
Se baixar os impostos sobre os combustíveis dá nenhuma garantia de baixar preços, a única maneira credível de fazê-lo é impor preços máximos dos combustíveis e impor perdas às empresas energéticas e aos seus acionistas. Baixar impostos só garante desonerar as empresas e perder receita fiscal, isto é, por-nos a pagar o resgate destas empresas (uma vez mais) e viabilizar a continuação da indústria fóssil.
Impor preços máximos dos combustíveis não nos resolve no entanto o problema real de uma fatia gigante da energia em Portugal e na UE (e no mundo) vir de um país com ambições imperialistas liderado por um facínora – e não nos podemos esquecer que 20% do petróleo em Portugal vem do Brasil liderado por Bolsonaro (que pode também num capricho começar uma guerra – até civil), e que 20% do seu gás vem dos Estados Unidos, que até há um ano atrás tinha ao leme Trump. Abordagens pelos preços só resolvem no curto prazo o aumento descontrolado dos preços provocado pelo frenesim especulativo dos mercados. Baixar impostos nem isso.
A solução para a situação é uma modificação fundamental da matriz energética, eliminando definitivamente o gás e o petróleo do sistema, não daqui a 30 anos, mas esta década. Isto tem de acontecer, independentemente da guerra. Para travar os piores cenários da crise climática e cumprir os minimos do Acordo de Paris é necessario cortar 50% das emissões globais ate 2030 comparando com o nivel de 2010. O único real e credível plano anti-guerra que existe hoje é uma transição muito acelerada, esta década, contra o interesse da maior parte das grandes empresas mundiais. O governo deve impor preços máximos aos combustíveis já e acelerar a transição energética a um ritmo de guerra.
Artigo originalmente publicado no Expresso a dia 18 de Março de 2022
Concordo totalmente. Essa imposição de um preço máximo está a ser considerada pelo governo, ou proposta por algum dos partidos com assento parlamentar? Ou terá de ser uma iniciativa de cidadãos?
Como todos sabemos, por experiência própria, a redução de impostos nunca se reflete no preço que pagamos. Mas servem para aumentar os lucros especulativos das grandes corporações e seus accionistas. Ao contrário do que nós impingem os hipócritas e os mentirosos sociais e intelectuais. Obviamente, o governo não vai definir preços máximos, já que está ao serviço das corporações e seus accionistas.