Solidariedade como princípio
O capitalismo é extrativista e vê tudo – as pessoas, o animais, as florestas, as montanhas, o solo – como um recurso por extrair e explorar. Esta lógica extrativista é a razão de fundo da crise climática.
Está em curso a mesma lógica nos projetos de mineração no Norte e no Centro de Portugal.
O que nos trouxe até aqui não nos vai salvar, vai apenas piorar a nossa situação. Isso chegava para solidarizar-nos com as populações locais contra as minas, mas há mais razões estratégicas.
A Justiça Climática é sobre travar a crise climática e instituir justiça global. Temos campanhas e ações, e tudo se cruza porque toda a exploração capitalista se cruza na rua: na Ação 1.5 na refinaria da Galp em Sines falámos sobre a necessidade de reduzir o uso de transporte individual; na ação Em Chamas contra a aviação falámos sobre um plano nacional de ferrovia que seja compatível com a ciência climática. Temos consciência de que estas reivindicações são – também – sobre os projetos de mineração em Portugal. O nosso discurso foi informado por essa sensibilidade política.
Mineração no contexto da emergência climática
Há quem ache que a mineração de lítio em Portugal vai ajudar a transição energética.
As empresas não acham isso. O governo não acha isso. A população local também não acredita.
Mas a comunicação social, informada pelos comunicados das empresas e dos governos, acha que sim… o que produz alguma confusão.
Parece que temos de voltar ao básico: mais painéis solares não reduzem as emissões. Mais eólicas não reduzem as emissões. Mais carros não reduzem as emissões. Reduzir as emissões é que reduz as emissões.
Alguém que constrói um parque eólico pode estar a contribuir para segurança do sistema energético, mas uma transição energética é quando uma infraestrutura poluente é fechada e substituída por alguma infraestrutura limpa.
Nós precisamos de que essa transição aconteça duma forma justa e rápida, para atingirmos neutralidade carbónica em 2030.
Rejeitamos uma discussão abstrata sobre lítio. Os contratos de mineração existem. Somos inequivocamente contra estes contratos. Só depois dos seus cancelamentos é que estamos dispostas a falar sobre lítio como algo estratégico para políticas energéticas.*
Os projetos de mineração fazem parte de um plano de expansão energética, empiricamente visível pelo mundo inteiro e também em Portugal.
O lítio (e os outros minerais) vão ser extraídos para ser vendidos no mercado. Neste momento a venda de carros elétricos está a aumentar, mas os SUVs também. Os carros em trânsito estão a aumentar. Isto não é nenhuma transição.
Os contratos assinados não referem qualquer substituição efetiva de carros a combustão. Se as empresas ganharem o conflito, apenas está garantido que se vão vender mais carros elétricos (e mais telemóveis).
Isto não é uma política climática. É um negócio de extração de recursos naturais. Estamos solidárias com as lutas contra a mineração. E repetimos: Estamos com as comunidades e do lado da proteção dos ecossistemas, que se encontram ambos na linha da frente de mais esta ameaça extrativista.
* Neste mesmo sentido e com uma ótica anti-capitalista, somos também céticas em relação às alternativas tecnológicas. A solução para uma mobilidade sustentável não será outra bateria, nem será hidrogénio: cada uma destas soluções, uma vez integradas nos mecanismos de mercado, degenera-se e começa a fazer parte do problema. A solução vai sempre passar por racionalizar a mobilidade: tornar o transporte individual numa exceção, numa sociedade com transportes coletivos públicos para todas as pessoas.
Nota final: Solidariedade ativa
Nada que dissemos acima é novidade para quem nos tem seguido. Aliás, temos um consenso coletivo contra os projectos de mineração desde 2019. Tivemos o assunto da mineração muito presente nos Encontros Nacionais pela Justiça Climática (“Mineração: Ameaça em Terra e no Mar” em 2020 e “Mineração em Portugal: na terra e no mar” em 2022). O relatório da campanha Empregos para o Clima apresenta como chegar à neutralidade carbónica em 2030 em Portugal, em particular como descarbonizar o setor dos transportes. (Ver a apresentação aqui.) Voltámos a falar sobre mobilidade e transportes públicos durante a Caravana pela Justiça Climática. Nas preparações do Acampamento 1.5, co-organizámos uma conversa sobre mineração e transição energética e fomos à conferência organizada pela Galp para denunciar os planos de expansão energética. Ao mesmo tempo, a campanha Empregos para o Clima preparou um estudo de caso sobre transição justa em Sines, em que voltámos à suposta refinaria de lítio e os transportes públicos. Estivemos também presentes nas ações e manifestações convocadas pelas populações locais. Nesses casos, em que nos solidarizamos com outros movimentos não assumimos protagonismo, não levamos as nossas próprias faixas.